terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Repouso



A tranquilidade adormece-me.

Visões aquietadas iluminam-me.
Sonho-te!
O perfume de ti inunda-me o olfacto.
Cheiro-te!
Sinto-te!
Inspiração morna alimenta-me os pulmões.
Respiro-te!
Neste mergulho na imaginação irreal sou anfíbia.
Sei-te!
Nas águas revoltas do sonho e nas terras da existência material.

Viajo em velocidade definida por ti.
Durmo, acordo, dormito, e flutuo em atmosfera quimérica.
És presença constante.

Não te consigo despir de mim.
És constituinte da minha essência.
És inevitabilidade doce.
E...prolongo meu repouso...até à impossibilidade.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Negro Profundo ( 20 )

Apesar da dor pela perda da mãe, Samara descobriu um contentamento inabitual em si. Voltara a embrenhar-se nos estudos, mas desta feita o Sol parecia sorrir-lhe. O exemplar aproveitamento escolar continuava. Contudo, acordava com uma boa disposição que a motivava.
Relembrava mais vezes do que desejava a mãe e toda a sua juventude conturbada.
No entanto, os telefonemas  de Luís deixavam-lhe o coração acelarado.
Em virtude dos irmãos Tavares se encontrarem todos a estudar em Lisbos bem como Matilde e Samara, os 'Cinco' da infância reuniam-se pelo menos uma vez por semana na cidade onde residiam no tempo de aulas, Lisboa. Era como o conforto e carinho de casa marcasse presença.
Haviam crescido juntos e sentiam-se família.
Matilde foi a primeira  a notar a alteração no relacionamento dos amigos. Sentia uma Samara mais envergonhada e um Luís, habitualmente grande sonhador, particularmente terreno e sempre preocupado com Samara.
Após a declaração de Luís, o comportamento de ambos tinha-se alterado como era de esperar.
Luís fragilizado, pela sua exposição, em tudo tentava cativar Samara. Esta deixava-se hipnotizar pelo seu amigo de sempre, porém a experiência conselhava-a prudência.
O ciclo académico acabou com aproveitamento e as pequenas férias serviriam para breve descanso e o retornar às Mimosas, lar sempre saudoso.
(continua)

" Apanhada na Curva "


A simplicidade pode ser associada à linearidade. Um horizonte sem obstáculos provoca-nos uma sensação de amplitude, de abrangência,talvez de plenitude.
Já na Matemática as linhas retas não dão azo a tanto estudo como as curvas ou as linhas com diversos ângulos.
Passa-se o mesmo com a vida.
Se nela pensarmos com objectivos definidos, prevendo o desfecho parece que toda uma segurança e confiança se instalam como nossas companheiras de jornada.
O problema surge quando a complexidade nos cumprimenta em forma de curvas, de tropeços que vão roubando a singeleza que nos descontrai.
A propensão que me assiste em pensar no real e no que é obra da minha imaginação fértil(?) leva-me a ser, tantas vezes, "apanhada na curva".
Nisto do pensamento prefiro as  retas tal como na condução: menos trabalho e olhando em volta tudo está sob controlo.
Eis uma grande ilusão: até nos trilhos mais lineares há curvas escondidas mesmo que imaginárias, acontecimentos inesperados, pedras atiradas sabe-se lá por quem.

Posso sempre buscar caminhos direitos, mas sou constantemente "apanhada nas curvas".
Uma constatação que me enerva: a surpresa é constante.
E sabem que mais? Nem sempre é mau.
Muito pelo contrário!

domingo, 2 de dezembro de 2012

Não Querer !

"É comum perder-se o bom por querer o melhor."
William Shakespeare


"A renúncia é a libertação. Não querer é poder."
Fernando Pessoa 


Não quero
perder-me na inutilidade de gritos inaudíveis.

Não quero
amor mendigado, aos pedaços.

Não quero
murmúrios convenientes embrulhados em seda.

Não quero
sonhos despertos que fazem tropeçar.

Não quero
verbos conjugados no frio da indiferença.

Não quero
favores perfumados de preços inesperados.

Não quero
o barulho, o ruído, os restos de mim.

sábado, 1 de dezembro de 2012

Negro Profundo ( 19 )

A inesperada declaração emudece Samara. A sua tenacidade no estudo e na conquista da independência não lhe deixavam tempo para namoros. O casamento que recusara tinham-lhe deixado trauma.
Pura e simplesmente deixara de pensar em si como mulher completa onde o género masculino seria incluído.
Perante o olhar angustiado e expectante do amigo que lhe exigiam resposta, hesita.
Balbucia algo como uma justificação de nunca ter pensado no assunto. Assegura-lhe que o adora, mas desconhece se os sentimentos poderão ser de outro teor.
Afiança-lhe que se fosse obrigada a escolher ele seria, na certa a primeira opção.
Luís fica desiludido com a reação de Samara. A amizade deles sempre tinha sido especial e, pensara ele, evoluira da forma mais natural: para o amor.
Smara pede-lhe um tempo para se organizar. Muita coisa lhe tinha acontecido em tão pouco tempo. Suplica-lhe que tenha paciência com ela e acima de tudo que não se afaste.
Luís, um pouco envergonhado, desculpa-se e apenas lhe diz para levar o tempo que necessitar.
Regressam à casa principal e é altura de arrumar as roupas, os livros. No dia seguinte regressarão a Lisboa a fim de completarem o segundo semestre do terceiro ano.
Jantam na casa grande e reagem como habitualmente.
Fazem a viagem juntos e quando se despedem, sem que Luís se dê conta, Samara ao se aproximar dele oferece-lhe a boca em sinal de promessa.
E nas nuvens, regressam às suas residências com a esperança de futuro amoroso na bagagem.
(continua)

Desejo . . .



Fora eu . . . lágrima . . . e seria carícia de tua face,
desaguando na tua boca.

Fora eu . . . brisa . . .  e envolver-te-ia o ser
com ventanias de desejo.

Fora eu . . . chuva . . . e molhar-te-ia o corpo
arrepiando-te com odor de terra molhada.

Fora eu . . .  cor . . . e cegarias na luz quente
do arco-íris da paixão.

Fora eu . . . fonte . . . e saciar-te-ias
na cálida fonte de mim.

Fora eu . . . mar . . . e mergulharias
no meu seio de maresia.

Fora eu . . . baía . . .  e voarias sem demoras
para a calmaria das minhas águas.

Fora eu . . . fada . . . e vaticinar-te-ia querer desmesurado
em terras só nossas.

Fora eu . . . tua . . . bastar-me-ia!

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Negro Profundo ( 18 )

Essa semana de luto conduziu a uma maior intimidade entre os dois amigos de infância.
A cumplicidade sempre tinha estado presente e conseguiam entender-se através de pequenos gestos involuntários, de olhares, enfim conheciam-se duma forma genuina e insubstituível.
Samara afastava os fantasmas que tinham regressado do seu passado: a rejeição da família, a intolerância que não conseguia perceber.
Por outro lado, o carinho com que era rodeada na familia adotiva ajudavam-na a superar pensamentos sombrios e liquidar qualquer assombração.
O jeito sonhador de Luís continuava a proporcionar-lhe momentos de riso. Desfazia-se em histórias de animais que nos íltimos anos povoavam o seu universo universitário no seio do Hospital Veterinário.
Tinham em comum o gosto pela vida, a saúde e trocavam conhecimentos.
Dentro em pouco seriam profissionais e ambos pretendiam regressar para a cidade perto das Mimosas onde esperavam poder ajudar, cada um na sua área.
Num dos passeios pelos campos coloridos, Luís traz a mão de Samara na sua como já era habitual.
Porém, desta vez, o rapaz pára e olha profundamente os olhos negros de Samara.
Esta até se asustou com o sério semblante. A brincadeira e o olhar alheado eram mais habituais na sua face.
Luís aproxima-se da face de Samara e deposita-lhe um leve beijo nos lábios.
Acrescenta: 'Sei que não é a melhor altura...mas, adoro-te, aliás, estou apaixonado por ti...queres ser minha namorada?'
(continua)

Era Uma Vez...(histórias para adormecer)


Passeio em trilho conhecido. Conheço cada curva, cada sombra, cada pedra que piso. O cenário roda consoante as estações naturais.
Prossigo, tenho de continuar.
Sempre.
Naquele dia a surpresa fez-se companhia de caminhada.

Conheci-te.

Rasgaste-me um sorriso e os teus olhos aprisionaram-me.

Nova vereda descobri, contigo.

Deste-me a mão e sem receios deixei-me conduzir.
As tuas palavras enfeitiçaram-me e as nossas passadas exalavam perfume embriagante.
O percurso foi intenso.
Mostraste-me uma dimensão secreta, um esconderijo apetecível.
Foste  Luz que dasabrochou uma mulher contida em mim.
Tornaste-te minha Estrela Guia, brilhando ao longe.
Sigo, repetidamente, pelo trilho conhecido sabendo-te aí, guardador de desejos proibidos.
E a história continua . . . desconhecendo o que a senda nos reserva, aguardando amoroso resgaste.

Esperas por mim?

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Negro Profundo ( 17 )

Após o funeral da mãe, apenas a avó se lhe dirigiu aconselhando-a a continuar afastada da família.
Tinha sido escolha dela, não poderia reclamar. Um terno beijo depositado na sua testa denunciava um carinho inexistente nas palavras proferidas por Aurora.
Toma o caminho da casa principal das Mimosas agora seu lar.
Altura de exames do primeiro semestre. Do Grupo jovem da herdade apenas Luís tinha faltado para receber e consolar a amiga. Aconselha-a a vestir outra roupa.
O negro pesa-lhe a silhueta.
Completamente exausta, sonâmbula, anui e dirige-se ao seu quarto, de há cinco anos a esta parte, contíguo ao de Matilde.
Aproveita para tomar um duche, veste uma ligeira camisa de noite e deixa-se envolver pela escuridão proporcionada pelas portadas cerradas em plena tarde luminosa.
As últimas quarenta e oito horas tinham-se transformado num pesadelo. Custava-lhe conciliar o sono apesar do torpor a invadir.
Familiares e amigos desfilavam à sua frente como se a  um filme assistisse.
Contudo, as cenas tinham como pano de fundo o cenário onde vivera as últimas horas.
Debatendo-se com os fantasmas é finalmente vencida e adormece.
Desperta após vinte horas de sono initerrupto, por volta da hora de almoço do dia seguinte.
Lentamente, recolhe as lembranças recentes, sente-se invadir por melancolia companheira.
Levanta-se, e ao abrir a janela, os pais de Matilde acorrem a saber da sua menina.
Samara,, apesar da dor presente causada pela eterna ausência da figura materna e pela indiferença sentida pelos membros do seu clã biológico, consegue esboçar um sorriso e sussura um: 'Estou bem.'
Sózinha, olha para o Negro total qua a vestira na véspera e decide não tornar a usá-lo.
Retomaria a vestir a roupa escolhida por si nas lojas da cidade.
Sabendo que já estava acordada, Luís fez questão de aompanhar a refeição da amiga de infância.
Como já tinham perdido os exames poderiam usufruir da próxima semana de férias e desfrutar da companhia um do outro.
Depois, recomeçaria o segundo semestre e com a exigência do curso, seria de esperar que Samara voltasse ao nível a que habituara amigos, professores, colegas e a si mesma.
(continua)

Silvestre


Silvestre é meu querer
à razão não gosta de obedecer.

Silvestre é meu palavrório
que se escapa de sensato território.

Silvestre é meu corpo desenfreado
sem defesas fica desamparado.


Sou florzinha silvestre.
Singela.
Sózinha.
Sem cuidados de jardineiro.
Nasci, cresci nos cuidados dos vendavais, do Sol abrasador.
Sou perfume bravio,
de toque rude.
Aguardo cuidados desbravados,
ternuras sonhadas
nas pétalas do meu ser.
Balouçando ao sabor da liberdade,
esboço sonhos...
Sem amarras ou entraves
alcanço vertigem selvagem.
E na vulnerabilidade do bravio
finco raízes
aguardando a colha do amor.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Senhora do Lago !


Escorre mel no teu lago guloso.

És minha morada,
habitat perfeito.

Sou nenúfar aberto
em branco luminoso.

Flutuo
alimentado-me de ti.

O delicado movimento do teu fluido ser embala-me.

Adoças-me
na mansidão do teu amplo abraço.

Ao sabor de murmúrios
danço na fronteira do ar com o liquido.

És lago meu,
de profundidade amada.

Sou senhora tua,
abandonando-me no teu húmido beijo.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Fosse eu ... um rio ...



Fosse eu...um rio...
Galgava o leito e inundava o teu ser com águas perfumadas.

Fosse eu...um rio...
Inundava o teu corpo quente com a fresquidão do meu querer.

Fosse eu...um rio...
Caía em cascata no abismo do teu olhar.

Fosse eu...um rio...
Marulhava suspiros inebriantes lançando-te feitiço.

Fosse eu...um rio...
Serpenteava o teu desejo provocando-te loucura.

Fosse eu...um rio...
Saciava-te a sede de prazeres inconfessáveis.

Fosse eu...um rio...
Mergulhava-te em mim...e desaguaríamos em praia deserta.

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Ano Novo...Calendário...Inquietações

Nem os apelativos calendários, já à venda, me fazem desejar o Ano Novo:  2013! Cujas passadas começam a fazer-se ouvir.
Admito que a passagem de ano sempre foi uma das minhas épocas festivas preferidas.
Até porque um dos acontecimento mais marcantes da minha existência ocorreu num desses eventos.

Contudo, este ano repleto de acontecimentos aflitivos a vários níveis está grávido de outros mais catastróficos.
Bem sei que pode ser só meu negativismo a falar: "...blá...blá...blá".

Já se aperceberam que (quase) todos os dias há notícias de aumentos de impostos e cortes em direitos essenciais?
A politica não é o meu forte. Nunca o será nem tenho tenções que o seja.
Mas, se o desemprego galopa, a população está envelhecida e cada vez reduzem mais os apoios relacionados com essas realidades que acontecerá à já nossa fraca economia?
Não sei! Nem quero saber.

Vem daqui a minha vontade de parar no tempo.
A esperança desapareceu do meu horizonte e não gosto nada da sensação, mesmo nada.

Para os entusiastas deixo uma sugestão de calendário aos admiradores do estilo mais nortenho da Europa:


Para os que preferem a tez mais morena também há opções:

O género masculino hetero que me perdoe, mas calendários de mulheres há em maior quantidade, é só procurar, a variedade é infindável.

Quanto a mim talvez opte pelo calendário chinês. Afinal pouco falta para tomarem posse de nós.

Ou talvez me renda ao Calendário Maia. Acabando em 21 de dezembro nem com o Natal terei de me preocupar quanto mais com novo ano.

Tudo isto para confessar que a catalogação do tempo pelos humanos me afeta.

E afinal são só momentos atrás de momentos...

domingo, 25 de novembro de 2012

Conheço-me ! ?

Com a imaginação a diluir-se na água incessante que cai, deixo que a Pantera mais feminina do Universo (pink, pois então) constate o óbvio:

* Sou a pessoa que mais sabe (ou tenho a obrigação de...) sobre mim. *

Afinal estou comigo, 24 horas por dia, desde sempre.
Senti cada segundo desta existência e experenciei todos os acontecimentos.

P.S. Qual a razão pela qual qualquer pessoa tem sempre opinão convencida sobre outrém?

sábado, 24 de novembro de 2012

Querido Diário...


Meu querido Diário,

Faz tanto tempo...já nem me recordo quando te escrevi pela última vez.
Sabes? Não tem sido por falta de tempo.
Nunca te cheguei a contar, mas alguém encontrou o meu 'caderninho' e fui castigada pelos sentimentos expostos. Há certas coisas que não conseguimos ou não podemos expressar na face de quem nos magoa.
Foi o caso.
A autoridade de mãe ficou beslicada pela minha irreverência nas confidências que te fiz.
Fui castigada por escrever sentires íntimos que à luz da distância parecem tão infantis. E eram-no realmente. Afinal mal tinha entrado na adolescência.
Pois bem! Senti-me violada e nunca mais te escrevi uma linha.
As palavras ditas podem ser esquecidas, reinventadas, argumentadas, distorcidas ou simplesmente ignoradas.
Agora a escrita é outra história. Constitui facto, prova de 'crime' e a interpretação tão subjectiva.
Por outro lado senti-me suja com o ocorrido e no alto da minha tenra idade a baixa auto estima não ajudou.
Passado já passou e nem sei porque me lembrei de ti.
A verdade é que aqui estou eu a dizer-te que já me aconteceram milhões de coisas, tropecei em muitas pessoas novas e 'eu' talvez já nem exista como me conheceste.
As conversas que tinha contigo acontecem agora no mundo dos meus pensamentos e são diálogos interiores.
Há pensares que não devem sair dentro de nós. Para o bem e para o pior.
Termino com carinho e saudade de tempos idos, de confiança pueril.
Saudades de mim, do projecto que poderia ter sido.

Até!

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

* Elevo-me *


Girando em voo lunar
ascende querer desmesurado.
Irresoluto odor de chamamento insensato.
Insana loucura grita, chamando.
Batalha travada entre o abismo do desespero e
a luz solar.
Rodopiando, balançam os sentimentos.
Contradições enroupadas em vestes apelativas.
Inquieta escolha aguarda momento  propositado.
No turbilhão de emoções elevo-me.
Desnudo-me de vontades e sentires.
Envolta em perfume  de liberdade,
acaricio pétalas de mim.
De longe, olho-te aprisionado no delírio da realidade.
Invoco-te em rituais de danças etéreas.
Balouçando, pairando na leveza de mim susurro:
- Vens ?

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Negro Profundo ( 16 )

Na actualidade, e com o romper do dia, as lembranças esvaneciam-se.
A dor da partida da mãe estrangulava-lhe a garganta. Aqueles últimos cinco anos tinham-na mudado. Conseguira estudar sempre com o apoio dos pais que a tinham adotado.
Estudava Medicina Dentária, concretização do sonho de criança.
Matilde enveredara pelas matérias da Biologia. João, gestor a finalizar o curso. Luís, que se tinha transformado no seu maior amigo e confidente, decidira ser médico de animais. Continuava a sonhar que iria salvar todos os seres vivos de maus tratos. O pequeno António, que se revelara um rapagão de ideias bem assentes, escolhera engenharia. Adora mecanismos, máquinas e desta forma saciava a sua curiosidade, estudando com prazer.
Matilde sentia-se bem apesar dos fantasmas da rejeição a assolarem de quando em vez.
A morte da mãe reavivava-lhe as assombrações.
A avó veio oferecer-lhe um chá quente. Samara, dormente da posição encaixada no corpo frio da mãe, desperta rápidamente.
Haviam chegado mais pessoas, o negro parecia a única cor existente.
Os homens trajavam integralmente o preto com o preto como adorno.
As mulheres escondiam-se nos seus lenços negros que lhes tapavam a cabeça descendo até à cintura.
Era o caso de Samara, respeitava os costumes e apresentava-se de negro profundo vestida.
O funeral seria dali a pouco.
Acariciando a gélida face da mãe, é depois desviada para o meio das outras mulheres.
O pai, Manolo, de sofrimento estampado no resto, recusa-se a olhá-la. Os seus irmãos solicitam-lhe atenção, de olhos ávidos.
Ainda vislumbra Gonçalo, já casado e com dois petizes pela mão.
Aurora, mulher experiente, avó amorosa convida-a a permanecer em silêncio para afastar distúrbios.
Samara cansada, tudo  cede. A dor experimentada não lhe ânimos para qualquer ação.
Apenas chora, lágrimas secas, dor lacinante.
No marasmo da insensibilidade, provocada pela tristeza, permite-se o embalo inconsciente  nas cerimónias costumeiras naquelas ocasiões.
(continua)

Distância

Percorro momentos de incontáveis segundos.
Passam instantes ao sabor da tua distância.
Aproximo-me permitindo o teu itinerário.
Alcançando-te em abraço de veludo,
prendes-me em laçada de beijo húmido.
Conduzes-me ao teu abismo gemido,
de corpos entrelaçados em único suspiro.
E a distância quimérica
desfaz-se no galope do amor.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Negro Profundo ( 15 )

Decorridos os dois anos a decisão era-lhe exigida. Sem rodeios, com vontade de despachar o assunto, pede audiência ao pai.
De rompante deixou que todos os sentimentos se lhe extravazassem.
O pai ouviu-a e sem possibilidade de apelo decretou: "Pois bem. Se é isso que queres, a partir de agora deixas de fazer parte desta família. Tens até ao final do dia para saires do acampamento."
Virou as costas, deixando uma Samara petrificada. A mãe começou os seus lamentos, agarrando-lhe as saias, pedindo-lhe que reconsiderasse a posição.
Aturdida, Samara pega nos seus parcos haveres, constituidos por livros e cadernos essencialmente. Dirige-se à casa grande.
O pai de Matilde encontrava-se no exterior, inspecionando um tractor que avariara. Ao vê-la percebeu que algo de grave e sério tinha ocorrido.
Semlhe pedir explicações, leva-a até à sala onde a põe à vontade. Quer saber onde pode ajudar.
Pela primeira vez Samara irrompe em pranto. Sem pressas o srº Teles deixa-a chorar até que a calma chegue.
A jovem inicia a narração contando o facto de ter recusado Gonçalo e as consequências que daí advieram. Tinha sido expulsa do acampamento da família. Desconhecia o que deveria fazer. Mas tinha uma certeza, nos seus desasseis anos, não casaria com Gonçalo. Nada de pessoal contra ele.
Apenas sonhava uma outra vida.
O srº Teles, entendendo-a e não querendo conflitos, assegura-lhe que aquela casa é dela também.
Só teria de esclarecer a situação com Manolo, pai defensor de tradições enraízadas.
Fê-lo de imediato e Samara passou a viver com Matilde, sua irmã do coração.
Lamentava ter-lhe sido vedado o contacto com os irmãos, o sobrinho e a mãe que sempre tinha estado de seu lado embora em silêncio. Sempre tinha sentido o seu amor.
(continua)

Passeio



Vestida de ignorado receio

inspiro perfumes do meio,

sonhando com o teu seio

recheado de delícias está cheio.

Tu vens, insinuas-te, alheio.

Fico enredada  na teia do teu enleio

que para mim é gostoso passeio.


P.S. Ninguém merece...

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Negro Profundo ( 14 )

Aqueles dois anos, apesar das rotinas habituais, foram desassossegados. Até perfazer desasseis anos continuou a estudar na companhia de Matilde e dos meninos da Herdade nos tempos mais frios do ano.
A pressão revelou uma Samara mais aplicada, com mais vontade de ser dona do seu medo. Apesar de todas as dificuldades era a melhor aluna. Os professores surpreendiam-se com tamanho empenho e trabalho.
Dedicando-se por inteiro à aprendizagem, encontrava conforto nas conversas e amizade dos companheiros de brincadeiras da Herdade das Mimosas, onde se sentia compreendida.
Gonçalo visitava-a semanalmente, possibilitando  um conhecimento maior do que pretendia ser seu marido.
Gostava dele, mas um fosso repleto de maneiras diferentes, opostas até, de encarar a vida, aumentava cada vez mais.
A identificação com as vidas e projetos de Matide e dos três irmãos Tavares crescia tanto quanto a sua maturidade. Integrava a família de Matilde e as vidas dos adultos das Mimosas eram-lhe referências.
Imaginava-se de poiso certo, vivendo em casa sólida, com emprego e depois, talvez, casando.
O noivado alargado tinha-lhe desperto o interesse pelo género masculino duma forma nova. Dava por si a discutir relações, sentimentos, com João, o mais ponderado e sensato. Contudo, era em Luís, o sonhador do grupo, que encontrava maior calmaria. Entendiam-se muito bem. Quase não necessitavam de articular palavras para se adivinharem.
Os olhos brilhantes de Luís transmitiam-lhe segurança, uma paz nova.
Inconscientemente começou a fazer comparações e, com o decorrer do tempo, o casamento com Gonçalo parecia-lhe uma realidade da qual não queria ser membro.
A liberdade chamava-a e esta não se encontrava no cumprimento de tradições e promessas impostas.
(continua)

O coração pode ser...



 - Meigo;
- Terno;
- Maldoso;
- Maroto;
- Doce...

Enfim, temos uma mania generalizada de sobrecarregar o principal orgão do sistema circulatório com todas as emoções.

Que tal deslocarmos sentimentos para outros orgãos?

Por exemplo, já dizemos que fulano tem maus fígados.

Sabem de mais algum orgãozito com sentires humanos???

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Negro Profundo ( 13 )

Nada notando de estranho, apenas o habitual movimento que antecede a preparação da refeição, Samara dirige-se ao seu canto de estudo.
Uma mesa improvisada serve-lhe de escrivaninha. Acende a lamparina e prepara-se para fazer os deveres.
Sente uma presença aproximar-se. Engana-se, são duas: a de seu pai e a de Gonçalo, o noivo a quem estava prometida.
O coração acelera-se. O pai adianta-se e pede-lhe que se  dirija à zona de convívio.
Samara ajeita os cabelos encaracolados e escondendo a nervoseira veste um porte seguro, quase altivo.
Gonçalo, ao vê-la aproximar-se, fica arrebatado. Conhecia Samara desde criança, por várias ocasiões tinham estado juntos. Esta menina-mulher em que se transformara seduzia-o. Quando chegara a altura de escolher companheira para a vida não hesitara, imaginando-se únicamente com Samara.
Após os cumprimentos iniciais o pai pede-lhe explicações.
Samara, calmamente, mostra a sua posição, declarando-se demasiado nova para casar. Nada tendo contra Gonçalo, pelo contrário, achando-o um rapaz atraente e bem formado, gostava de continuar a estudar e deixar as ideias de casamento para mais tarde.
Sem interferir no diálogo dos jovens, Manolo segue atentamente a conversa.
O 'noivo rejeitado' entende as razões da menina.
Propõe um acordo. Visto ela ter apenas catorze anos, contra os dezasseis dele, adiariam dois anos, tempo em que haveria espaço para se conhecerem melhor e concretizarem o que se propunham.
À falta de melhor, Samara concorda com o diferimento.
Teria o aliado 'Tempo' como conselheiro.
Logo se veria.
(continua)

P.S. Peço desculpa às amigas(os) pela demora na publicação de novos capítulos desta 'novela' sem classificação. As tramas da realidade podem ser mais enleadas do que as  ficcionadas. De qualquer das formas, tenho como característica 'acabar obra iniciada'.
Nada prometo, vamos ver, como tão bem pensa Samara...

Há dias...


Há dias que parecem não ter fim.
Seja pela felicidade extâsica ou pelo medo paralisante.
Há dias para tudo.

Persegue-se o desejo, o sonho com intentos de plena realização.
Há dias em que tudo acontece do avesso.
Decidimos optar pela coragem e enfrentar a fúria da besta do quotidiano.

Há dias em que sucumbimos ao receio, de nós próprios, dos outros, de fantasmas.
Há dias de puro deleite onde a leveza do nosso ser é tal que nos sentimos alados e voamos.
Cerrando os olhos ou abrindo-os em policiamento defensor, há dias que o controlo escapa-se-nos.
Há dias em que o Mundo se veste de coloridos sorrisos que nos contagiam e iluminando-nos o rosto.
Há dias em que as lágrimas  desautorizadas  correm toldando-nos o olhar.
Há dias em que a coragem decide fazer greve e as atitudes balançam em fracos gestos. 
E hoje é um dia!

sábado, 17 de novembro de 2012

AFLORES

Por aqui há Flores (gostas do trocadilho, caro amigo?), muitas e lindas.
A Blogosfera consegue surpreender-me tanto.
E pela positiva. Muito pela positiva.

Desta feita o meu querido amigo Aflores , do amoroso Blogue http://ailaifeblog.blogspot.pt/ , presenteou-me com um delicioso gelado na Sincelo (estou mortinha por conhecer) em vitude de ter encabeçado o Top de comentadores do ano.
Parece-me que já cá cantam dois, mas isso é outra história.


Corações combinam muito bem comigo, singela Pérola, em formação.
Nem tenho palavras para expressar o meu agradecimento a tamanha honra.
Só posso dizer que moras no meu coração (real, não virtual), amigo Alberto!
Obrigado!

Para ti:
 Ofereço-te Flores que tão bem combinam com o teu nome:


E mais Flores:


Cuida muito bem desse  coraçãozinho.
É especial!