segunda-feira, 25 de junho de 2012

Negro Profundo ( 5 )

As primeiras lembranças remontavam ao nascimento do seu irmãozinho, Igor. Tinha quatro anos. Proibida de entrar na tenda, ouvia os gritos da parturiente até que uma amostra de bébé lhe foi apresentada como membro da família. A pele avermelhada, as caretas inumanas, tinham-na impressionado. Recusara o convite de lhe pegar ao colo e refugiara-se na árvore centenária da herdade onde acampavam todos os finais de verão até por alturas do regresso do bom tempo.
Perdia-se nas brumas da memória coletiva o ínicio de tal tradição.
A Herdade das Mimosas dispensava, todos os anos, amplo prado, na zona de um monte, com casario em ruínas, onde se chamava lar durante meses. Preferia este lugar ao mais a norte, onde eram acolhidos nos meses mais quentes.
É verdade que as sombras, em maior número que tornavam suave o calor estival, o curso de água, cristalino e abundante,  fonte de intermináveis brincadeiras, eram uma escolha sensata.
Mas, para Samara nada se comparava à extensão, sem fim, da paisagem alentejana. 
A preferência da menina, contudo, prendia-se, mais, com as amizades que travara com a filha dos proprietários da Herdade, Matilde, de idade próxima da sua, e com os filhos dos caseiros.
Os pais permitiam-lhe o acesso à escola durante a permanência por terras de Mimosa e Samara tirava proveito dos livros emprestados pela sua grande amiga. Com eles aprendera a ler, a saber de outras vidas, a conhecer animais exóticos e até a saborear palavras, sem sentido, das poesias,  que declamavam com encenados jeitos teatrais, no meio de vacas que as olhavam com indiferença.
(continua)

4 comentários:

Lilá(s) disse...

Estou de volta...e reparei que andas a escrever muito! é linda esta história, terei que voltar breve para ler o resto...
Bjs

Unknown disse...

Pérola, boa noite!
Lembranças de saudade e dor em simultâneo.
Continuo presa a esta crónica que me apaixonou logo de inicio.

Beijinho,
Ana Martins

Meu Velho Baú disse...

Mais um capítulo e mais um olhar pela paisagem Alentejana.
Sabendo sempre mais um pouco sobre a vida da pequena Samara.
bjs

Mona Lisa disse...

Um desfiar da memórias magoadas e aprazíveis...

Que se seguirá?

Hummmmm...o suspense aumenta!

Beijos.