Fruto da instabilidade outonal, ou talvez não, a realidade é que a garganta arranha-se-me. Até tenho dificuldades em adormecer com a sensação incómoda. Já nem sei que mais hei-de tomar.
Mas, pior que este desconforto doentio, é saber de situações que me arranham as vísceras fazendo-me sentir repugnância pela humanidade traduzida em usos e costumes ( de respeitar, já sei, estudei Antropologia) que não consigo tolerar.
O(a)s mais sensíveis, hoje, não leiam.
Venho falar de Waris Dirie que será conhecida de muitos, mas admito a minha ignorância.
Menina nascida no Deserto da Somália, que não sabe ao certo a sua idade. Na actualidade 45/46?.
Passou a infância a pastorear os camelos e cabritos de seu pai em pleno deserto.
Aos 5 anos foi submetida à mutilação genital. É um rito em que as meninas são cortadas, para se manterem virgens até ao matrimónio.
Não desço a pormenores porque me envergonham e arrepiam.
Fugiu aos 13 anos para escapar ao casamento forçado com um homem de 60 anos que prometeu por ela 5 camelos.
Atravessou mais de 500 km de deserto sózinha, descalça até chegar à capital Mogadíscio. Aqui uma tia, casada com um diplomata, que ia para Londres levou-a consigo.
Na capital londrina, enquanto trabalhava como empregada de limpeza foi descoberta por um fotógrafo que a lançou no mundo da moda.
Tornou-se modelo de prestígio internacional ganhando fama, êxito e dinheiro.
Depois de deixar as 'passerelles', a moda e cinema passou a dedicar-se à luta contra a mutilação genital percorrendo o mundo pela causa.
Graças ao seu trabalho de divulgação e consciencialização, 16 países africanos já proíbem tal prática.
Fundou a Fundação 'Desert Dawn' para lutar contra esta violência.
Voltou à sua terra natal, onde as mulheres são meros animais sem direitos, após 22 anos. O pai já frágil e cego revelou-lhe que estava orgulhoso dela (?!). E ela chorou...
Um mundo inimaginável para os comuns portugueses.
Hoje é embaixadora da ONU para o combate à mutilação genital.
Interrogada se mudaria algo no seu corpo, as suas pernas arqueadas, responde que não. Essas pernas são fruto da desnutrição que sofreu enquanto criança e recordam-na das suas raízes.
E afirma:
"A única beleza que valorizo é a da alma. Devemos estar gratos por estar vivos."
P.S. E a garganta inflamada deixou de me incomodar...