domingo, 26 de fevereiro de 2017

de mim

Sou dona 
das águas,
de rios
e oceanos
onde te desaguas
de mansinho.

Sou rainha
de paralelos,
hemisférios
e litorais
de cada coordenada tua.

Sou baía
serena,
confluência de leitos,
encontro do teu mar,
da minha torrente,
ribeira a transbordar
em dias
de chuvas eternas.

Sou pérola
guardada
em profundezas
subtis,
abismo sem fim,
em que mergulhas
sem me ver.


Sou corpo imerso,
afogo na sede
de te receber.

sábado, 25 de fevereiro de 2017

na tela



Talvez seja desejo,
talvez seja delírio
este sonho
de te pintar.

Saber-te a meu gosto,
de linhas
e contornos 
decorados
em minha mão.

Sentir-te o cheiro
a novo
como paixão por consumar,
antecipação 
de tela por pintar,
desassossegos
que me implodem.

Oxalá seja amor,
oxalá seja carinho
os rabiscos coloridos
desenhados com meu corpo,
com minh'alma.


quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

da vida em teia



A vida tem destas coisas:
enredos naturais,
tramas surgidas do inesperado,
telas tecidas em rede,
teias simples
ao primeiro olhar.

E porque esta complexidade
nos perturba,
gostamos de dar nós,
emaranhar fios frágeis,
instantes reais
onde basta ser
fiel a si próprio,
permitir e aceitar.

A vida tem de tudo,
é cargo pessoal
torná-la ligeira
na proteção de sopros indesejados,
ou confusa
nos cruzamentos da escolha,
trilhos e veredas
a chamarem por nós.

As balanças vêm depois
e só importam 
no peso leve
do amor próprio, 
em liberdade responsável
de ser acto e consequência,
enfim,
baraço de seda em teia brilhante
ou embaraço grosseiro enovelado
em labirintos nossos.

A escolha é tua
e minha,
nossa, 
de cada um.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

carta em branco


As palavras são teus cabelos,
coam-se entre dedos,
em brincadeiras rebeldes
de suavidade presa
na ponta da pele.

Fogem-me vírgulas,
pausas refugiadas 
pelo teu pescoço,
sem interrogações
ou exclamações
de lugar certo.

Ressoam ecos dessas palavras
que fugiram à tinta
ritmados no cair da água,
do duche, 
em tuas madeixas molhadas
escorregando-me
na espuma do que ficou por dizer,
sem ponto final,
rimas ou métricas.

São afagos desembaraçados
nesse pentear sem letras
enleados em minhas mãos,
toque de poesia,
paixão
e amor,
tão só.

As palavras não me obedecem,
esquecem-se do meu chamamento,
do meu desejo,
deixam a carta em branco,
restando a mensagem escrita
nas linhas desarrumadas
do teu cabelo
onde rabisco
o quanto te quero.

domingo, 19 de fevereiro de 2017

teu último beijo



Guardo teu último beijo
a sete chaves,
poção de amor
húmida,
sabor de mim
na tua boca.

Não me chames louca
pois 
se não me deixas escolha,
ou te guardo
ou te odeio.

Ajeito este meu tesouro
em minha mão,
frágil cristal,
cravado na memória
de meu ser.

Fecho a caixa
de outros dias,
outras vezes
onde me fui
louca,
quiçá.

Arrumo o liquido
do meu olhar,
amor salgado,
o mar,
 teu último beijo.

domingo, 12 de fevereiro de 2017

ao sol pôr

Dormito embalada
pelo vagar das ondas,
na carícia do sol pôr.

Espreguiço as pressas,
soltando-as no areal,
como quem quer calma.

Pouso-me no horizonte
para além de mim,
devolvendo aos céus o que não é meu,
reunindo grãos,
pedaços da minha essência.

Comungo desta respiração do mar,
da terra e do ar,
buscando-me, procurando-me
em desvario sossegado
com cheiro a maresia.




menina de ouro


Foto by Pérola

Enches meu colo
com teu sorriso,
inundando meus olhos
ao te saber 
pedaço de mim.

És ternura sem tréguas,
mimo tão bom
que a loucura
me espreita
na ausência de ti.

Fazes festa
em te seres,
encanto crescido
pelo tempo 
que sempre vem.

Contigo a luz é brilhante,
os dias vestem-se de cor,
meu coração bate mais forte
em amor 
à minha menina de ouro.




sábado, 11 de fevereiro de 2017

à janela


Vejo-te para além
da tristeza,
para além do cinzento
que me rodeia.

Toco-te sem o saberes,
ao de leve,
tão devagarinho
que ninguém me ouve.

Desejo-te tanto
que meu corpo se contorce
em espasmos de agonia,
aflição irrespirável.

Procuro-te nas brumas
da lembrança,
névoa nascida
desta demanda por ti.

Quero-te sem esta ansiedade
por demais sentida,
como quem está à janela
de outra casa,
de outra rua,
de outro eu.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

do teu colo


Meu amor não é simples,
não é linha reta
e não é frágil.
Não!

Meu amor é embaraçado,
é novelo sem ponta
e é forte.
É!

Meu amor tem dia sem hora,
ano sem começo,
contorno sem arte,
ferro sem solda.

Meu amor me faz enfrentar
 tempestades dispersas,
nesse jeito de amar,
despovoado de primaveras,
onde o fio do coração
pende no metal sem ouro,
por entre frios antigos.

Meu amor traça o ar,
em movimentos impulsivos,
oxigenados na busca 
de miragens ásperas,
na esperança da fundição morna
do teu colo.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Ensaio para Ela


Para lá do espelho,
na dimensão funda de se ser,
ela acreditava-se.

Era tal o desplante
que o atrevimento se envergonhava
de pôr em voz,
atitudes,
ou palavras 
o que a alma lhe segredava.

Para lá do mundo,
no espaço de si,
ela autorizava-se.

Era tal a ousadia
que o receio se minguava
em vontades 
para lá do conveniente,
em apetites fora de hora,
saboreando na pele
o sentir 
(também)
de ninguém a adivinhar.

Para lá de tudo o resto,
de tudo,
de todos,
e mais 
das imagens de si,
ela avaliava-se, 
existia na palpitação
da plenitude
de se saber mulher,
exclusiva,
de singularidade a preto e branco,
sem meios tons,
na inteireza feminina.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

minha mão


tenho na mão

nascentes, rios e poentes;
vales espraiados
na bainha de montanhas
por acontecer;

quimeras sopradas 
na ventania 
da liberdade:

ousadias escondidas,
segredadas,
na conspiração
de energias minhas,
alheias,
ou desconhecidas;

vida minha,
frágil,
desassossegada,
brotada em humanidades 
de opostos
em equilíbrios ténues
pesados em minha mão.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

de meus pés



Dizes que são a minha cara,
e eu,
só me desequilibro
perco o chão,
vacilo por entre
sedas e brilhantes.

São charmosas,
as tuas escolhas!

Fantasias-me
em vagarosas caminhadas
esvoaçando acima da calçada
com pés de púrpura calçados.

Mal tu sabes
das minhas ganas
de me despir
e,
de pés nus,
correr no areal húmido
de beijos salgados.
onde cada grão,
colado nos meus pequenos pés,
é sensação guardada
em oceanos de vontades
de te envolver
na pele
que insistes em adornar.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

balada triste

Fazes ritmo na toada
em harmonias improváveis,
na textura dos sentidos,
que se bailam
por entre dedos
e solfejos soltos
em pressas demoradas.

Tocas perfumes
de outros aromas,
de outras cores,
de outros tons.

És assim,
maestro e instrumento
de esquecimentos em sinfonia,
orquestra e batuta,
de delírios meus 
ao te querer,
em filarmónica,
por pautas nossas
no dó por ti escolhido,
restando-me no refrão
por acontecer.

Racionalizas cores,
os sons da música,
pulsar do meu ser,
cadência solta 
nas lágrimas 
de nevoeiro 
por onde me cego
nesta balada triste.